8 de dezembro de 2013

"Anteonde"

Ali, nas seis,
Manhã acima,
Chegava ao fim o relógio.

Depois ao lado,
Hoje em dia -- cá, nenhures.

Às vezes, sorria adiante:
Atrás, faltava de súbito.

Agora, em onze,
Seguindo o meio e o fio,
Parto eu defronte ao aceno.

Bem cedo, abaixo,
Momento em solo aquém.

E silêncio.

Tão longe contava:
Lá dantes... Amiúde além.

(Os giros, as voltas, uma elipse.
Ser-estar sem ter nada a tecer.)

Ora em casa, tênue assento,
Sobrepõe-se afinal
Esse altivo desvio de fato.

Doravante, [um nome] sou n'algum tempo --
E em lugares eu passo e vou.

A voz que hoje pleiteia,
Ontem foi só distante lampejo.

Sucessiva paixão lentamente.



(08122013)
Gustavo Lacava



PS: As lentes, os focos e as margens -- tudo isso, na Física, me interessa. O resto, a incerta prevalece.

30 de novembro de 2013

Exemplar único


Talvez tenha aprendido a mentir
Tão sutilmente
Que sempre retorno a mim.

Continuo o mesmo:
Penso em ser lembrado,
Quero um dia ser lido.

Não apenas na história,
Muito menos nas quinas-memória.
Dois cantos tão equidistantes
Da mesma mesma mesma alínea.

Talvez seja a conquista da dúvida
Sombria e soturna
Que irá demarcar o meu fim.

Sigo sempre o óbvio:
Escrevo pra quaisquer,
Desejo o instante do susto-surgir.

Não tão pouco é pela estrada,
Nunca pelos entraves do tempo.
São as esferas sobrepostas
Limítrofes deste único fim.

"Haverá cadeira
Nesta cidade
Para minha espera?"

7 de novembro de 2013

Lógica

Vida,
Responda-me
Se e somente se,
Tão somente quando
-- Eu adoro essas expressões --,
O tempo lhe deixar.

11 de maio de 2013

Europa

Rasgo a última pétala de lembrança,
Esqueço senhas, projetos e danças.
Guardo apenas a poesia que tua imagem
À minha memória veio suscitar.

(Um zunido baixo de passos e trejeitos de princesa.)

Agora a palavra tilinta brilhante
Adornada em cor azul em lazúli.

Brinco, contando instáveis fagulhas
Enquanto essas linhas passam a existir...

E repito sempre o mesmo processo:
De nomear o tempo e a saudade
Apenas para que tu possas persistir.

(31052007)

Post scriptum: Jano nos vigia.

Pose

Em casa,
Sozinho,
No espelho,
Eu bebo sangue e sal.

Das valas
E das feridas,
Impelidas as chagas
Pelas talas
Dessa máscara
Em meu rosto
Tão já encrustada.

(120806)

Vezes quatro

No traço incerto destes termos
Arma-se uma única questão:
Como serão meus desejos
Nestes próximos seis anos?

Será como uma descoberta de um caderno
Antigo e cheio de rascunhos,
Desenhos que a razão ultrapassou?

Difusa

É que nada acontecia
Visto não haver nenhuma poesia
Pairando sobre as coisas,
Trotando entre os ventos.

Tudo é somente imagem vazia.
Carta em branco,
Sem valor nem presença.

É que nada se ouve
Por entre os rumores da cidade.
Tudo é cheio de um silêncio espesso.

Espera.

Encontrar o contraste perfeito,
A distância correta entre o branco e o preto
Que uma vez ousei escrever --

Talvez?
É o que posso por ora.

Borges destruidor


 LA NOCHE CÍCLICA
A Sylvina Bullrich
Lo supieron los arduos alumnos de Pitágoras:
los astros y los hombres vuelven cíclicamente;
los átomos fatales repetirán la urgente
Afrodita de oro, los tebanos, las ágoras.
En edades futuras oprimirá el centauro
con el casco solípedo el pecho del lapita;
cuando Roma sea polvo, gemirá en la infinita
noche de su palacio fétido el minotauro.
Volverá toda noche de insomnio: minuciosa.
La mano que esto escribe renacerá del mismo
vientre. Férreos ejércitos construirán el abismo.
(David Hume de Edimburgo dijo la misma cosa).
No sé si volveremos en un ciclo segundo
como vuelven las cifras de una fracción periódica;
pero sé que una oscura rotación pitagórica
noche a noche me deja en un lugar del mundo
que es de los arrabales. Una esquina remota
que puede ser del Norte, del Sur o del Oeste,
pero que tiene siempre una tapia celeste,
una higuera sombría y una vereda rota.
Ahí está Buenos Aires. El tiempo que a los hombres
trae el amor o el oro, a mí apenas me deja
esta rosa apagada, esta vana madeja
de calles que repiten los pretéritos nombres
de mi sangre: Laprida, Cabrera, Soler, Suárez...
Nombres en que retumban (ya secretas) las dianas,
las repúblicas, los caballos y las mañanas,
las felices victorias, las muertes militares.
Las plazas agravadas por la noche sin dueño
son los patios profundos de un árido palacio
y las calles unánimes que engendran el espacio
son corredores de vago miedo y de sueño.
Vuelve la noche cóncava que descifró Anaxágoras;
vuelve a mi carne humana la eternidad constante
y el recuerdo ¿el proyecto? de un poema incesante:
«Lo supieron los arduos alumnos de Pitágoras...»

Passos

A tragédia do humano
Reduz-se ao constante engano
De nunca ser no tempo.
Está sempre num lance
Para além do evento.

Tal como a rima
Suposta ao final do soneto.

Preso ao pulso,
Agora dispara sem contar
O cavalo em trote,
A aguda quina entre os ponteiros
Da máquina.

A tragédia do humano
Dissolve a lembrança,
Esfumaça qualquer ritmo.

Então inventa-se o invento
Desejando um dia voltar.

A letra, o risco, a marca.

Quem sabe um dia,
Sem muito pensar,
Talvez estes passos
Contra fatos
Impor-se-ão.

(11052013)

10 de maio de 2013

Lance

Assim, quando quero,
Vocifero ou padeço.
Confundo tudo em todos:
Imperfeição tão evidente.

Uma quina de um dado,
Os lados dispostos,
O espaço disforme,
Aresta em deriva.

Mas a voz grafada
Segue nova vez intacta
No lance do instante,
No gesso da página.

Então, quando quero,
Aposto no acaso,
Num conjunto de fatos
Que nunca serão.

Poesia.

E erro o palpite --
Imprevisto do verbo.
Passo de ser a estar:

Um dilúvio.

Só o equívoco verá,
Se tais reverências valerão.
Ou não tanto assim,
O segredo cifrado
Colocar-se-á nas veias das teias da noite.

Repetir mas nunca mais deixar faltar.

(30042013)